onde se fala do acordo ortográfico....
e1. Curiosidades da Língua
Portuguesa
-
A língua portuguesa, com mais de 210 milhões de falantes nativos, é a quinta
língua mais falada no mundo.
- A terceira mais falada no mundo ocidental.
- Idioma oficial único do
Brasil, e idioma oficial, conjunto com outros idiomas, de Portugal (cuja
segunda língua oficial é o Mirandês),
Angola,
Cabo Verde,
Guiné-Bissau, Macau, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste, é falada
na antiga Índia Portuguesa (Goa, Damão, Diu e Dadrá e Nagar-Aveli), além de
ter também estatuto oficial na União Europeia, no Mercosul e na União
Africana.
- A situação da Galiza e do galego em relação ao português é controversa. De
um ponto de vista político e, portanto, oficial, o Galego é uma língua
porque assim o determinam os organismos de estado Espanhol e da Região
Autónoma da Galiza, com legitimidade democrática. De um ponto de vista
científico, a ideia de que o galego é uma variante dialetal da língua
portuguesa reúne hoje um vasto consenso, sendo estudado a par com as
restantes variantes do português nas universidades e centros de investigação
linguística
- A língua portuguesa é uma língua românica (do grupo ibero-românico), tal
como o castelhano, catalão, italiano, francês, romeno e outros.
Assim como os outros idiomas, o português sofreu uma evolução histórica,
sendo influenciado por vários idiomas e dialetos, até chegar ao estágio
conhecido atualmente. Deve-se considerar, porém, que o português de hoje
compreende vários dialetos e subdialetos, falares e subfalares, muitas vezes
bastante distintos, além de dois padrões reconhecidos internacionalmente
(português brasileiro e português europeu). No momento atual, o português é
a única língua do mundo ocidental falada por mais de cem milhões de pessoas
com duas ortografias oficiais (note-se que línguas como o inglês têm
diferenças de ortografia pontuais, mas não ortografias oficiais
divergentes), situação a que o Acordo Ortográfico de 1990 pretende pôr
cobro.
- Segundo um levantamento feito pela Academia Brasileira de Letras, a língua
portuguesa tem, atualmente, cerca de 356 mil unidades lexicais. Essas
unidades estão dicionarizadas no Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa.
- O português é conhecido como A língua de Camões (por causa de Luís de
Camões, autor de Os Lusíadas), A última flor do Lácio, expressão usada no
soneto Língua Portuguesa de Olavo Bilac ou ainda A doce língua por
Miguel de Cervantes.
- Nos séculos XV e XVI, à medida que
Portugal criava o
primeiro império colonial e comercial europeu, a língua portuguesa se
espalhou pelo mundo, estendendo-se desde a costa Africana até Macau, na
China, ao Japão e ao Brasil, nas Américas. Como resultado dessa expansão, o
português é agora língua oficial de oito países independentes, e é
largamente falado ou estudado como segunda língua noutros.
- Há, ainda, cerca
de vinte línguas crioulas de base portuguesa.
É uma importante língua
minoritária em Andorra,
Luxemburgo (25% da população total), Namíbia, Suíça e África do Sul.
Encontram-se, também, numerosas comunidades de emigrantes, em várias cidades
em todo o mundo, onde se fala o português como Paris na França;
Toronto, Hamilton,
Montreal e Gatineau no Canadá;
Boston,
New Jersey e Miami nos
EUA; Nagoia e
Hamamatsu no Japão, Sydney na Austrália.
Leia mais em:
http://pt.wikipedia
.org/wiki/ L%C3%ADngua_ portuguesa
2. ACORDO ORTOGRÁFICO
2.1.1.
Entrevista do Fiorin no Portal do Sinpro
Sindicato dos Professores de São Paulo. Edição nº 175 -
28/9/2007 “A Língua Portuguesa não está correndo perigo”
Entrevista com José Luiz Fiorin, professor de Linguística da USP
Esse acordo de unificação ortográfica, embora esteja em discussão agora, na
verdade tem as raízes no início da década de 1990. O senhor pode resgatar os
momentos mais marcantes dessa trajetória?
Olha, antes de recontar essa trajetória, eu preciso dizer que esse assunto só
está tendo essa repercussão toda porque muitas coisas não foram explicadas, ou
não foram explicadas direito. A primeira dessas coisas é que o acordo é para
unificação da ortografia da Língua Portuguesa, e não da Língua Portuguesa. A
língua é uma coisa viva, mutante, que varia de acordo com a província, com os
enunciados e com as necessidades dos falantes daquela língua. Não dá para
uniformizar a pronúncia, o estilo, a poesia da língua. O que dá para unificar é
a grafia, a representação gráfica e é exatamente isso que o acordo propõe. Pode
parecer um detalhe pequeno, mas ele faz toda a diferença. Agora sobre a história
do acordo, em 1945 Brasil e Portugal já tinham tentado estabelecer uma certa
unificação. Portugal chega a implementar, mas o Brasil não. Em 1990, sob o
comando do professor Antônio Houaiss, é feito um memorando entre a Academia
Brasileira de Letras e a Academia de Ciências de Lisboa que propõe que até 1994
deveria ser firmado um acordo entre todos os países que falam Português, oito
até aquele momento, para unificar a grafia das palavras. Em 2006, as duas
assinaturas, de Cabo Verde e São Tomé, somadas à do Brasil, que já havia se
manifestado em 2001, fazem o acordo entrar – teoricamente – em vigor.
Por que teoricamente?
A entrada em vigor do acordo não é automática e
se efetiva a partir do momento em que o terceiro membro da comissão de países da
Língua Portuguesa ratifica o protocolo?
Sim, pelo que foi acordado sim. No momento da terceira assinatura, o país
signatário deve fazer um comunicado oficial para que os demais países comecem a
se movimentar em relação a isso. Acontece que Portugal, um dos signatários, não
fez nem isso.
Por que não fez?
Foi uma decisão simbólica. Depois das declarações de adesão, seria automático
que os países se movimentassem para esclarecer suas populações a respeito das
mudanças, além de produzir novos e de refazer antigos materiais didáticos, para
que professores pudessem conhecer e ensinar as novas grafias. Além disso, seria
criado um prazo para que as editoras e demais empresas de materiais gráficos se
adaptassem à nova realidade. Tudo isso é trabalhoso, claro, mas seria ainda mais
complicado se se tratasse de uma reforma ortográfica. E não é isso, é um acordo
de unificação ortográfica.
Antes de explicar porque Portugal não cumpriu o acordo, o senhor pode
diferenciar reforma ortográfica da ideia de unificação ortográfica?
A ortografia não reflete exatamente o que é uma língua. A ortografia é uma
convenção, regida por lei, que retrata graficamente as palavras de uma língua.
Agora a língua mesmo é bem mais que isso. A gente fala, a gente se expressa, a
gente ama, a gente se desespera e a gente mostra o que é em Português. A língua
é isso, é essa tradução da identidade do povo. A ortografia é só a representação
gráfica disso tudo. E ela não é capaz de refletir com exatidão. A gente fala “di
dia”, e a grafia correta é “de dia”. A gente fala “lobu”, e a grafia é “lobo”.
Então nem sempre a grafia é a representação mais fiel da língua, fora os
sotaques, as entonações, as variações regionais, tudo isso. Uma reforma radical
da língua apontaria na direção dessas mudanças. Adaptar a língua escrita à
língua falada. E por que
os países não fazem isso e por que não foi isso que o acordo propôs?
Porque seria trabalhoso demais repor todo o material gráfico dos países, por
exemplo...
Sim, mas mais do que isso, porque em coisa de duas gerações todos os livros e
materiais didáticos estariam obsoletos e há países com milênios de cultura
letrada e eles não se arriscam a perder esse patrimônio. E também a escrita traz
as tradições, a história e a identidade de cada lugar. Reformar tudo isso é se
desfazer de uma parte dessa trajetória e isso nem sempre é interessante.
Essa é a reforma. E o acordo de unificação ortográfica, o que ele prevê, em
linhas gerais?
O que os países de Língua Portuguesa acordaram foi unificar as formas de
escrever aquelas palavras que são escritas diferentemente em cada localidade.
Então “batismo”, que é “baptismo” em Portugal, perderia o “P” e seria escrito
batismo. Isso porque, embora o “P” esteja lá, ele não é pronunciado. No caso de
“facto”, o “C” é pronunciado, então a solução é outra. Nesses casos, foram
mantidas as duas formas de grafar: “fato” e “facto”. As duas passam a ser
corretas e oficiais. Então veja que as diferenças foram respeitadas. Só se mudou
aquilo que diferia muito nas grafias de cada língua e só aquilo que não ia mudar
demais a relação dos falantes com o português. Ainda para garantir isso,
“econômico” e “econômico” passam a ser grafias corretas, assim como “Antônio” e
“Antônio”, “fêmur” e “fêmur”. Então aquele argumento de que não é uma unificação
verdadeira porque permite duas grafias é uma bobagem, porque as duas grafias
passam a ser consideradas oficiais. Então unifica o valor de ambas.
Mas afinal, por que Portugal não fez a comunicação que lhe cabia?
Veja só. Hoje, nos lugares onde se fala português, se chega um material didático
brasileiro, isso tem que ser adaptado, para que seja um documento oficial e
dentro dos padrões legais. O Brasil não, mas os países africanos de Língua
Portuguesa têm um português muito próximo ao de Portugal, muito mesmo, então não
é errado dizer que Portugal, ali, é a autoridade no que diz respeito à língua. E
o acordo de unificação não é o fato mais importante do mundo, mas também não é
uma bobagem à toa. A unificação causou uma gritaria danada em Portugal
principalmente porque o acordo é acusado de abrasileirar demais a língua e isso
seria uma espécie de colonização feita pela antiga colônia. Ou seja, Portugal
perderia seu posto de metrópole. Eles afirmam lá que apenas 0,5% das palavras do
Brasil seriam alteradas, enquanto 1,5% das de Portugal passariam por alterações.
E isso é demais para os portugueses.
Em termos reais, de quantas palavras estamos falando?
Quem sabe? Porque não dá para quantificar as palavras de uma língua e também
ninguém sabe de onde tiraram esses números. Mas se um dicionário normalmente
traz 200 mil palavras, estamos falando de mil, mais ou menos. Outra coisa que os
portugueses afirmam é que não admitem o acordo porque estão guardando a pureza
da língua. Mas veja, uma teoria até com pouco prestígio hoje diz que nos centros
irradiadores da língua, Portugal, por exemplo, ela sofre muito mais mudanças e
se distancia muito mais do original que nas periferias e nas antigas colônias.
É aquela história de o português falado no Brasil ser muito mais parecido com
o que se falava no século 16?
Exatamente. Ou seja, aqui o Português é mais antigo e, portanto, quem guarda a
pureza somos nós e não eles. Mas tudo isso é bobagem. A questão certa é outra.
E qual é?
Se o acordo de unificação ortográfica entrar mesmo em vigor, teremos que
reconhecer que a legitimidade da língua não está mais somente com Portugal, mas
sim com os oito países da <http://www.cplp.org/>
CPLP. Esses países foram colônias de Portugal e, por um acordo, passam a ter
simbolicamente o mesmo direito e o mesmo poder sobre a língua. O Brasil não se
coloca nessa
posição de colônia há muito tempo e levar ao mundo essa forma brasileira de
escrever o português é uma afronta a Portugal. É contra isso que eles se
colocam. Se o português do Brasil também passar a ser oficial nos lugares onde
essa língua é usada, imagine o valor simbólico – e porque não dizer econômico,
já que estamos falando de circulação de bens – que isso tem. Deve ser uma ofensa
a Portugal essa projeção brasileira na lusofonia.
E aqui no Brasil? Como está a resistência ao acordo?
Coloca-se contra quem não compreendeu que se trata apenas da unificação das
grafias. E a culpa nem é das pessoas. O problema é que não se explicou direito o
que é o acordo. Quem é contra o acordo porque afirma que ele não unifica nada
acaba perdendo os argumentos. Mesmo frente à dupla grafia, como já explicamos, e
quando se entende que o acordo coloca o Brasil num outro
patamar em relação aos países lusófonos, mesmo que para isso a gente tenha que
abrir mão do trema, as pessoas acabam aceitando, por conta desse valor simbólico
que já dissemos.
O trema vai fazer falta?
Não, que nada! Ninguém nem usa mais e, além disso, não é o acento ou a trema que
possibilitam a total compreensão da palavra e do seu sentido no texto, é o
conhecimento da língua, a proximidade dos significados das palavras. A gente é
absolutamente capaz de entender quando se quer dizer “amara” ou “amará” pelo
sentido do texto, mesmo que o acento não esteja lá. O acordo não vai derrubar
isso, mas o que quero dizer é que é mais importante as pessoas conhecerem e
saberem usar a língua que manter o trema, ou o acento diferencial.
Como derruba alguns acentos, a reforma vai tornar o português um idioma de
certa forma mais jovem, mais moderno, mais próximo da língua que os jovens usam
nos chats, nos blogs e nos e-mails?
De jeito nenhum. Nada disso. Até porque, quando se propôs o acordo, a internet
nem era essa coisa tão difundida que é hoje. Então não foi essa a inspiração.
Não foi esse descompromisso com as regras gramaticais que norteou o acordo.
Então a língua portuguesa não está correndo riscos?
Não, não mesmo. Não corre, e não vai correr enquanto as pessoas conversarem em
Português, fofocarem em Português, se declararem amorosamente em Português,
usarem o Português para expressar os momentos mais profundos de sua existência e
também nos momentos mais íntimos e rezarem e xingarem em Português. A língua é
viva, independentemente da forma como seja grafada. O que é preciso olhar é que,
no Brasil, a gente tem sim um problema de compreensão na leitura e de redação
dessa língua. Mas não por conta dos acentos ou do trema. É por um problema de
ensino mesmo. É o Português ensinado e aprendido nas escolas o problema. E a
razão para isso é que a Educação nunca é prioridade nos governos. Tanto é que a
Comissão nem se preocupa com a assimilação da nova grafia pelos professores e
com o seu ensino. Com o tempo isso vai sendo assimilado sem grande sofrimento,
basta ter contato com a língua escrita. O acordo de unificação não vai nem
melhorar nem piorar o ensino do Português nas escolas, porque, nesse caso, o
problema está no ensino e na aprendizagem, e não na Língua Portuguesa.
E quais são os próximos passos e etapas do processo, já que Portugal ainda
não se manifestou?
Enquanto isso não acontece, o acordo não entra em vigor. Então o que temos que
fazer são dois trabalhos simultâneos. O primeiro é ter gestões nos países de
Língua Portuguesa para que esse impasse tenha fim e para que eles se programem
para as mudanças. E, segundo, é ir preparando internamente a agenda das mudanças
e adaptações que vamos precisar fazer para aplicar na prática um acordo como
esse. Estamos mais perto que longe da implantação, mas não dá para saber quanto
tempo ainda vai levar.
http://www.sinprosp<http://www.sinprosp.org.br/especiais.asp?especial=175&materia=403>.org.br/especiais.asp?especial=175&materia=403
2.1.2.
15.9.07 - "Estado de S. Paulo"
publica artigo de embaixador de Portugal sobre Acordo Ortográfico
É hoje publicado no principal jornal brasileiro, o "Estado de S. Paulo", um
artigo da autoria do embaixador de Portugal no Brasil, Francisco Seixas da
Costa, sobre a temática do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, com o título
"Estamos de acordo!".
transcreve-se esse texto:
Nos últimos meses, verifica-se que o tema do novo Acordo Ortográfico da
Língua Portuguesa tem estado em grande evidência no espaço público brasileiro.
Nessa abordagem, a posição de Portugal tem merecido algumas referências, em
alguns casos com imprecisões que parece importante não deixar passar em claro.
Não interessa fazer aqui um historial do que foram as anteriores tentativas de
unificação ortográfica, nem elaborar um inventário de supostas culpas pelo seu
limitado sucesso. A doutrina, neste âmbito, divide-se muito. Assim, proponho que
olhemos adiante.
A reiteração da vontade de caminhar para uma norma comum, bem como o surgimento
de novos países de expressão portuguesa, conduziu, em 1990, à assinatura de um
novo Acordo Ortográfico, o qual deveria ter entrado em vigor, para todos os
então sete subscritores, em 1994. Portugal ratificou esse acordo logo em 1991.
Dois Protocolos Modificativos foram, entretanto, assinados. Um primeiro, em
1998, eliminando a data de 1994 como limite para a entrada em vigor do Acordo,
por se constatar a inexistência de ratificações suficientes até então. Um
segundo, consagrando a entrada de Timor-Leste e prevendo que o texto do Acordo
pudesse entrar em vigor desde que três países tivessem depositado entretanto os
instrumentos de ratificação.
Em finais de 2006, verificou-se que Brasil, Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe
haviam ratificado esse segundo Protocolo, pelo que é entendido que o Acordo pode
entrar em vigor. Algumas vozes consideram que, não obstante estes requisitos
formais estarem preenchidos, seria importante que Portugal estivesse associado,
desde o início, à entrada em vigor do novo Acordo.
Convém fazer aqui um parêntesis para sublinhar que, pela aplicação do Acordo,
1,6% do total do vocabulário usado em Portugal (e nos restantes países que
seguem a norma portuguesa) deverá sofrer adaptações. No Brasil, essas mudanças
abrangem apenas 0,5% das palavras. Mesmo assim, tem vindo a ser anunciado que o
Brasil prevê a necessidade de um período de transição para a plena aplicação do
Acordo, de forma a permitir aos seus agentes editoriais fasearem os impactos das
mudanças, em especial nos dicionários e livros escolares.
Gostava de deixar bem claro que Portugal defende, como sempre defendeu, a
importância de se caminhar num processo de harmonização ortográfica, em especial
pela dimensão estratégica desse passo na capacidade de afirmação da Língua
Portuguesa no mundo. Noto que, pela parte portuguesa, o Acordo assinado em 1990
poderia ter entrado em vigor em 1994, o que não aconteceu por razões a que
Portugal foi então alheio. A circunstância de tal não ter ocorrido acabou por
suscitar no meu país uma reflexão mais amadurecida sobre os efeitos, em especial
editoriais, das mudanças que o acordo implicaria. O Governo português não pode
deixar de ser sensível a este debate, tanto mais que as alterações que
atingiriam a norma de Portugal são bem mais significativas que no Brasil. É do
saldo final dessa reflexão, a qual deverá também atentar nos períodos de
vigência dos manuais escolares, que vai depender a definição da posição
portuguesa, que também tem de passar pelo necessário período de adaptação, antes
da vinculação definitiva a uma futura norma comum.
Nas relações luso-brasileiras, parece por vezes existir um tropismo no sentido
da dramatização das pequenas dissonâncias, como se o entendimento mútuo tivesse
ciclicamente de passar por renovadas provas. A questão do Acordo Ortográfico
parece estar a ser um desses temas, como se uns anos a mais ou a menos na
conclusão de um texto trouxessem algum mal ao mundo, que viveu sem ele até
agora. O leitor ajuizará sobre se estaremos assim tão distantes: este artigo foi
escrito sem recurso a nenhuma palavra que necessite de harmonização ortográfica.
Esta é a melhor prova de que, afinal, e no essencial, estamos de Acordo!
Publicado pela Embaixada de Portugal - Brasília em 15.9.07
<http://embaixada-
portugal- brasil.blogspot. com/2007/ 09/estado- de-s-paulo- publica-artigo-
de.html>
<http://www.blogger.
com/email- post.g?blogID= 3812320326629671 113&postID= 705219660791388790>
2.1.3. revista VEJA – CAPA – 12/09/07
Especial - Riqueza da língua .
Ferramenta fundamental na carreira e no crescimento pessoal, o português pode
ser transformado por um acordo ortográfico. Mas essa não é a única revolução
por que a língua está passando.
Jerônimo Teixeira / Lailson Santos
MEIA-SOLA ORTOGRÁFICA
"Sou contra o acordo. Sei que isso é um tiro no próprio pé, pois, se o acordo
passar, vou ser chamado para fazer muitas palestras. Mas não quero esse
dinheiro, não. Com outro espírito, outra proposta, uma unificação talvez fosse
possível. Mas esta é uma reforma meia-sola, que não unifica a escrita de fato e
mexe mal em pontos como o acento diferencial. Vamos enterrar dinheiro em uma
mudança que não trará efeitos positivos."
Pasquale Cipro Neto, professor de português
Engavetado desde sua assinatura, em 1990, voltou a assombrar o acordo
ortográfico que visa a unificar a escrita do português nos países que o adotam
como língua oficial. O Ministério da Educação chegou a anunciar a entrada em
vigor da reforma no Brasil já em 2008. Felizmente, essa data foi postergada. Por
mais modorrenta que seja, essa discussão não deve se extinguir. Ela tem
implicações profundas de ordem técnica e comercial, além de provocar ainda mais
ansiedade nos milhões de brasileiros mergulhados em dúvidas no seu empenho
diário para falar e escrever bem. Dominar a norma culta de um idioma é
plataforma mínima de sucesso para profissionais de
todas as áreas. Engenheiros, médicos, economistas, contabilistas e
administradores que falam e escrevem certo, com lógica e riqueza vocabular, têm
mais chance de chegar ao topo do que profissionais tão qualificados quanto eles
mas sem o mesmo domínio da palavra. Por essa razão, as mudanças ortográficas
interessam e trazem dúvidas a todos. O acordo diz como se devem usar o hífen e o
acento agudo e outros desses minúsculos sinais gráficos que já fizeram estatelar
muitas reputações. A diferença entre um sucesso e um vexame pode ser determinada
por uma simples crase mal utilizada. Portanto, não há como ignorar quando os
sábios se reúnem para determinar o que é certo e errado no uso do português.
Nas grandes corporações, os testes de admissão concedem à competência
linguística dos candidatos, muitas vezes, o mesmo peso dado à aptidão para
trabalhar em grupo ou ao conhecimento de matemática. Diversas pesquisas
estabelecem correlações entre tamanho de vocabulário e habilidade de
comunicação, de um lado, e ascensão profissional e ganhos salariais, de outro.
Salte-se agora do micro para o macro. Uma decisão aparentemente arcana sobre o
uso correto do trema, por exemplo, pode ganhar contornos bem mais amplos em um
momento em que os idiomas nacionais sofrem todo tipo de pressão
desestabilizadora. Como diz o linguista britânico David Crystal (veja <http://veja.abril.com.br/120907/p_088.shtml#entrevista#entrevista>
entrevista), a globalização e a revolução tecnológica da internet estão dando
origem a um "novo mundo linguístico". Entre os fenômenos desse novo mundo estão
as subversões da ortografia presentes nos blogs e nas trocas de e-mails e o
aumento no ritmo da extinção de idiomas. Estima-se que um deles desapareça a
cada duas semanas. Cresce a consciência de que as línguas bem faladas,
protegidas por normas cultas, são ferramentas da cultura e também armas da
política, além de ser riquezas econômicas.
A reforma do português ora em curso vai se defrontar com um desafio inédito.
Outras mudanças foram feitas em situações em que era bem menos intenso o ritmo
de entrada de palavras e conceitos na corrente da vida cotidiana. Em tempos de
internet, as línguas, por natureza refratárias a arranjos de gabinete e
legislações impostas de cima para baixo, podem se comportar como potros
indomáveis. Quem vai ligar para as novas regras de uso do hífen quando mantém
longas e satisfatórias conversações na internet usando apenas interjeições e
símbolos gráficos como os consagrados "emoticons" para alegre :-) ou triste :-(?
David Crystal cunhou o termo netspeak para designar as formas inéditas de
expressão escrita que a internet gerou. A inclusão de símbolos audiovisuais, os
links que permitem "saltos" de um texto para o outro – nada disso existia nas
formas anteriores de comunicação. A comunicação por escrito se tornou mais ágil
e veloz, aproximando-se, nesse sentido, da
fala. "A necessidade de diminuir o tempo de escrita e se aproximar do tempo da
fala levou os usuários a ser cada vez mais objetivos e compactos", diz o
linguista Antônio Carlos dos Santos Xavier, da Universidade Federal de
Pernambuco (UFPE). Essa tendência é mais notória nas conversas que os
adolescentes mantêm através de programas como o MSN, com abreviações como blz
(beleza) e frases de sonoridade tribal como bora nu cinema – pod c as 8? (vamos
ao cinema – pode ser às 8?). Mas o netspeak não é só para os imberbes. Até no
âmbito profissional a objetividade eletrônica está imperando. A carta comercial
que
iniciava com a fórmula "vimos por meio desta" é peça de museu. "Gêneros como a
carta circular ou o requerimento estão em extinção. O e-mail absorveu essas
funções", observa a linguista Cilda Palma, que, em sua dissertação de mestrado
na UFPE, estudou a comunicação interna de uma empresa pública – um posto
regional dos Correios – e de uma empresa então recentemente privatizada, a
Petroflex. Ela constatou que a correspondência eletrônica tornou a comunicação
mais informal – e que essa tendência foi mais longe na empresa privada. Observa
a pesquisadora: "Os Correios ainda mantêm uma infraestrutura anacrônica, que
exige fotocópias e carimbos nos comunicados internos".
Embora a língua sofra ataques deformadores diários nos blogs e chats, a palavra
escrita nunca foi usada tão intensamente antes. Os mais otimistas apostam que os
bate-papos da garotada travados com símbolos e interjeições hoje podem ser a
semente de uma comunicação escrita mais complexa, assim como o balbuciar dos
bebês denota a prontidão para a fala lógica que se seguirá. Pode ser. Seria
ótimo que fosse assim. Por enquanto, uma maneira de se destacar na carreira e na
vida é mostrar nas comunicações formais perfeito domínio da tradicional norma
culta do português. Vários estudos demonstram a correlação positiva entre um bom
domínio do vocabulário e o nível de renda, mesmo que não se possa traçar uma
correlação direta e linear entre uma coisa e outra. Além de conhecer as
palavras, é preciso que se tenha alguma coisa a dizer de forma lógica e
racional. O vocabulário, por si só, não garante precisão ou beleza na escrita.
"Machado de Assis compôs toda a sua obra com aproximadamente 12.000 vocábulos,
enquanto Coelho Neto, autor ilegível, teria empregado mais de 35.000 palavras
diferentes na sua longa e obscura carreira", lembra o professor de português
Cláudio Moreno. Mesmo que pareça meio quadrado na mesa do bar, quem mais se
distanciar do linguajar trivial dos chats nas comunicações formais mais será
notado pela competência.
É empobrecedor, porém, ignorar a revolução cultural da internet. Como toda
inovação tecnológica abrangente, a civilização digital ampliou o léxico de
muitos idiomas, entre eles o português. E o fez, basicamente, pela incorporação
de palavras em inglês (site, download, hardware). Essas adições causam horror
aos puristas da linguagem. Bobagem. A maior fonte de enriquecimento dos idiomas
em todos os tempos é a incorporação de vocábulos oriundos de línguas
estrangeiras e de revoluções tecnológicas. O português cresceu muito enquanto
seus navegadores exploravam os "mares nunca dantes navegados" cantados por Luís
de Camões. "Calcula-se que o português medieval tinha perto de 15 000 vocábulos.
Em meados do século XVI, com a expansão marítima, o total chegaria a 30.000,
40.000", observa o filólogo Mauro Villar, do Dicionário Houaiss. Nesse processo,
é preciso levar em conta também a popularização do vocabulário especializado,
que em geral não entra nos dicionários. Por mais abrangente que seja um
dicionário, ele recolhe apenas algumas centenas de milhares de palavras. O
Houaiss tem perto de 230.000 verbetes. O Oxford English Dictionary, o famoso OED,
registra 615.000. Ambos são recortes muito limitados de um universo em
permanente expansão. Só as palavras necessárias à prática da medicina estariam
na casa de 600.000. Eventualmente, uma grande virada em um desses campos
científicos puxa o vocabulário especializado mais para perto do chão dos
dicionários. DNA é um exemplo eloquente: o acrônimo em inglês de ácido
desoxirribonucléico (componente fundamental do
código genético) saiu dos laboratórios e se incorporou ao dia-a-dia.
A internet é, além de tudo, um campo essencial na disputa pelo mercado dos
idiomas. O estudo da economia da língua é um campo promissor. A Fundação
Telefônica, da Espanha, está promovendo um projeto de pesquisa que deve durar
quatro anos e pretende aferir o peso econômico do idioma espanhol no mundo. "O
valor de uma língua se relaciona com sua capacidade de incentivar os
intercâmbios econômicos", explica o economista José Luís Garcia Delgado,
coordenador do projeto. Embora não seja possível atribuir uma cifra monetária a
uma língua, faz pleno sentido falar no valor relativo que ela tem na comparação
com outras línguas. O número total de falantes nativos é
um fator essencial. O espanhol tem cerca de 450 milhões, patamar semelhante ao
do inglês (o português fica em torno de 250 milhões). O inglês, porém, domina a
internet: de acordo com o Internet World Stats, site que concentra números
mundiais sobre a rede, 30% dos usuários da rede são falantes nativos do idioma
de Shakespeare, contra 9% de usuários da língua de Cervantes. Mais importante, o
inglês é forte como segunda língua. O British Council estima que pelo menos 1
bilhão de pessoas estão estudando inglês hoje no mundo.
"O inglês está destinado a ser uma língua mundial em sentido mais amplo do que o
latim foi na era passada e o francês é na presente", dizia o presidente
americano John Adams no século XVIII. A profecia se cumpriu: o inglês é hoje a
língua franca da globalização. No extremo oposto da economia linguística
mundial, estão as línguas de pequenas comunidades declinantes. Calcula-se que
hoje se falem de 6.000 a 7.000 línguas no mundo todo. Quase metade delas deve
desaparecer nos próximos 100 anos. A última edição do Ethnologue – o mais
abrangente estudo sobre as línguas mundiais –, de 2005, listava 516 línguas em
risco de extinção.
O português está entre os vencedores da globalização. É uma língua que vem
crescendo na internet: nos últimos sete anos, o número de falantes da língua
portuguesa que navegam na rede aumentou em 525% (embora ainda represente apenas
4% dos usuários). O acordo ortográfico tem a intenção manifesta de incrementar o
"valor de mercado" do português. Desde o início criticada dos dois lados do
Atlântico, a unificação da língua portuguesa foi uma causa cara ao filólogo
brasileiro Antônio Houaiss, morto em 1999. O acordo foi firmado em 1990 pela
Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), então com sete membros –
Brasil, Portugal, Angola, Moçambique, Cabo Verde,
Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe. Mais tarde, o Timor Leste também faria sua
adesão. Os prazos de implantação das novas regras estipulados em 1990 nunca
foram cumpridos, e a ratificação do acordo foi adiada sucessivamente. Um novo
acerto firmado em uma conferência de chefes de estado da CPLP em 2004 determinou
que bastaria a ratificação de três membros para que o acordo entrasse em vigor,
o que aconteceu no fim do ano passado. O problema é que só os três países que
ratificaram – Brasil, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe – deram mostras de querer
levar a reforma adiante. Naturalmente, nenhuma unificação ortográfica merece ser
chamada assim se a matriz da língua,
Portugal, não a seguir. Autoridades portuguesas têm falado em esticar os prazos
de adaptação às novas regras em até dez anos.
VEJA ouviu quatro profissionais da língua portuguesa. O único que considera a
unificação importante do ponto de vista da política da língua é o gramático
Evanildo Bechara, da Academia Brasileira de Letras. Mas ele faz restrições ao
conteúdo da reforma, que teria perdido a oportunidade de racionalizar algumas
regras. Os outros três especialistas são mais radicais na crítica. "É um acordo
meia-sola", avalia Pasquale Cipro Neto. Ele cita algumas palavras que continuam
sendo grafadas de duas formas, conforme a pronúncia ou as idiossincrasias de
cada país – caso de "cómodo" (Portugal) e "cômodo" (Brasil), ou de berinjela/beringela.
"Essa ideia messiânica, utópica de que a unificação vai transformar o português
em uma língua de relações internacionais é uma tolice", diz o professor Cláudio
Moreno. Sérgio Nogueira considera que só uma categoria vai ganhar vantagens com
o
acordo: os professores que dão aulas e palestras sobre língua portuguesa. "Se a
reforma sair, vou ficar rico de tanta palestra que vou dar", ironiza. As
editoras em geral estariam no lado perdedor do acordo, já que teriam de adequar
seus catálogos à nova grafia. O custo médio para a revisão e a preparação de um
único livro ficaria em torno de 5.000 reais. A revisão de enciclopédias e
dicionários seria ainda mais custosa. "Só a atualização do nosso banco de dados
ficaria entre 200.000 e 400.000 reais", calcula Breno Lerner, diretor-geral da
Melhoramentos, que publica os dicionários Michaelis.
As diferenças culturais não se resolvem assim apenas com um golpe de pena. Mesmo
com a ortografia unificada, dificilmente uma dona-de-casa portuguesa vai comprar
um livro de culinária brasileiro que fala em "açougue" ("talho" em Portugal), e
o carpinteiro brasileiro com um manual português nas mãos talvez fique
embasbacado com a palavra "berbequim" (furadeira). De outro lado, a grafia cheia
de letras mudas – facto, acto – não impediu o português José Saramago de
ser best-seller no Brasil. Como a natureza, a arte e a inteligência sempre
encontram uma maneira de se manifestar. Com a ajuda de uma norma culta e
amplamente aceita, esse trabalho fica mais fácil.
Lailson Santos
MINHA PÁTRIA, MINHA LÍNGUA
"Creio que a unificação do português tem um sentido político positivo. Aumenta o
conceito da língua como nação. A adaptação talvez seja difícil. Mas a língua é
um organismo vivo e vai seguir em frente. No meu trabalho de compositor, a
ortografia repercute pouco. Nas letras de rock, a gente trabalha com a
informalidade, com a fala da rua."
Tony Bellotto, músico da banda Titãs, autor de Bellini e a Esfinge e
apresentador do programa Afinando a Língua
PREGUIÇA CÉTICA
"Encaro com grande ceticismo esse acordo ortográfico. É uma reforma tímida, que
não traz grandes inovações. Mas não gostei. Queria que meus tremas ficassem onde
estão. Os escritores mais velhos e mais preguiçosos têm de confiar no pessoal da
editoração para fazer as mudanças necessárias no texto."
João Ubaldo Ribeiro, escritor, autor de Sargento Getúlio e Viva o Povo
Brasileiro
Oscar Cabral /Ernani d'Almeida
MUDANÇA TÍMIDA
"Do ponto de vista político, a unificação ortográfica é importante. Implica numa
maior difusão da língua portuguesa nos seus textos escritos. Mas a reforma
poderia ter avançado mais e de forma mais inteligente na racionalização dos
acentos e do hífen. As regras ainda são pouco acessíveis para o homem comum."
Evanildo Bechara, gramático, membro da Academia Brasileira de Letras
Mirian Fichtner
SIMPLES E CIVILIZADA
"A unificação já devia ter ocorrido antes. É uma medida civilizada. A diferença
na escrita dos países que falam português atrapalha o intercâmbio econômico e
editorial. Como toda reforma, essa proposta tem suas falhas. Mas acho ótimo, por
exemplo, o fim do trema. Sou a favor de tudo que vai no sentido da
simplificação."
Lya Luft, escritora, autora de Perdas & Ganhos e colunista de VEJA
UMA REVOLUÇÃO SEM GRAMÁTICA Divulgação
David Crystal: a política está sempre por perto das questões linguísticas
Professor honorário de linguística da Universidade do País de Gales, em Bangor,
David Crystal, de 66 anos, é uma das maiores autoridades mundiais em linguagem.
Autor de A Revolução da Linguagem (Jorge Zahar), ele falou a VEJA sobre as
mudanças que a internet trouxe ao uso da língua e sobre as línguas em extinção.
A INTERNET ESTÁ MUDANDO O CARÁTER DAS LÍNGUAS?
Em cinquenta ou 100 anos, todas as línguas que utilizam a internet serão
diferentes. Está surgindo o que chamo de netspeak, "fala da rede", ou
comunicação mediada pelo computador, em jargão acadêmico. Ainda é impossível
prever, no entanto, quais serão a forma e a extensão dessa mudança. Leva muito
tempo para que uma transformação efetiva se manifeste numa língua. No inglês,
por exemplo, notamos uma grande diferença entre a linguagem de Chaucer e a de
Shakespeare. Duzentos anos separam o nascimento de um e de outro. Pergunte às
pessoas quando foi a primeira vez em que elas mandaram um e-mail. Foi há dez,
talvez cinco anos. É algo recente demais. Existem
curiosos fenômenos de ortografia, o uso de sinais tipográficos e dos chamados
emoticons. Mas, se procurarmos por novas palavras ou uma nova gramática na
internet, não encontraremos muita coisa. O inglês é uma língua com mais de 1
milhão de palavras, e somente umas poucas centenas foram incorporadas a ela por
causa da internet. Isso não altera o seu caráter.
A INFORMALIDADE É UMA CARACTERÍSTICA CENTRAL DO NETSPEAK?
Sim, até o momento. Isso tudo começou com os nerds da internet, há vinte, trinta
anos. E eles eram rebeldes. Viam a rede como uma revolução, uma alternativa
democrática às formas de comunicação mais formais. Esses pioneiros não
pontuavam, não se preocupavam com ortografia, criavam formas estranhas de grafar
as palavras. Quando a internet se espalhou, a informalidade se popularizou
também. Nos anos 80 e 90, e-mails se tornaram muito informais. Mas a idade média
do usuário de internet vem subindo, e com
isso a comunicação está ficando mais formal novamente. Acredito que os estudos
sobre netspeak que virão daqui por diante vão documentar um aumento da
formalidade.
O SENHOR AFIRMA QUE, NO ATUAL RITMO DE EXTINÇÃO, EM UM SÉCULO TEREMOS SÓ
METADE DAS LÍNGUAS QUE SÃO FALADAS NO PLANETA HOJE. POR QUE TANTAS LÍNGUAS ESTÃO
DESAPARECENDO?
O principal motivo é a assimilação cultural por causa da globalização. O
crescimento das grandes línguas do mundo funciona como um trator, esmagando os
idiomas que se põem no caminho. Isso não é um fenômeno restrito a duas ou três
línguas. Não é apenas o inglês que ameaça línguas nativas na Austrália, ou o
português que põe em perigo idiomas indígenas no norte do Brasil. O chinês, o
russo, o hindi, o suaíli – todas as línguas majoritárias ameaçam idiomas de
comunidades pequenas. O futuro dessas línguas minoritárias está vinculado a
políticas regionais. Nos lugares onde elas sobrevivem, há uma série de práticas
políticas e econômicas que valorizam a diversidade.
O QUE SE PERDE QUANDO UMA LÍNGUA MORRE?
Quando me fazem essa pergunta, costumo rebater com outra: como seria o mundo se
a sua língua não houvesse existido? O que você teria perdido, o que todos
teríamos perdido se não existisse o português? Se não houvesse o inglês, não
teríamos Chaucer, Shakespeare, Dickens. Quando colocamos as coisas nesses
termos, as pessoas veem Uma língua expressa uma visão peculiar do mundo. Não
importa se a comunidade que utiliza essa língua vive em uma selva, em um iceberg
ou na cidade, sua história, seu ambiente e seu modo de pensar não têm igual. O
único meio de comunicarmos a percepção do que é ser humano em determinado
ambiente é através da linguagem.
NO BRASIL, JÁ HOUVE TENTATIVAS DE RESTRINGIR LEGALMENTE O USO DE PALAVRAS
ESTRANGEIRAS, ESPECIALMENTE DO INGLÊS. O INGLÊS PODE SER CONSIDERADO EM ALGUMA
MEDIDA UMA AMEAÇA AO PORTUGUÊS?
Não, de forma alguma. Esses movimentos puristas aparecem no mundo todo. E o fato
básico é que todas as línguas tomam empréstimos das outras. Ao longo dos últimos
1.000 anos, o inglês incorporou palavras de mais de 350 línguas. Só 20% das
palavras do inglês atual remontam às origens anglo-saxônicas e germânicas da
língua. Essa incorporação de palavras tornou o inglês uma língua expressiva e
rica. Shakespeare não poderia escrever o que escreveu se não contasse com um
vocabulário que era germânico, francês e latino. Palavras se incorporam a uma
língua não para destruí-la, mas para permitir novas oportunidades de expressão.
Se cada palavra que entra no português apagasse uma palavra anterior, isso seria
de fato um fenômeno estranho e indesejável. Mas não é assim que funciona. A nova
palavra não substitui palavras preexistentes, ela passa a vigorar ao lado delas.
A língua evolui desse modo e alcança uma gama expressiva mais ampla.
COMO LIDAR COM A QUESTÃO DO VOCABULÁRIO IMPORTADO AO EDUCAR AS CRIANÇAS?
Os jovens gostam de usar palavras estrangeiras, pois em geral elas soam
inovadoras. Gostam também de empregar gírias que eles próprios criam. Não se
pode proibir jamais crianças e adolescentes de utilizar suas formas particulares
de linguagem. É como dizer a eles: "Valorizem a linguagem – mas não a sua
própria". É muito importante que, nas escolas, os estudantes aprendam toda a
gama de possibilidades da língua. Eles precisam descobrir que há palavras
tradicionais e palavras novas para as mesmas coisas. E devem saber também a
diferença estilística entre essas opções.
2.2.13.
POR QUE O INGLÊS É A LÍNGUA MAIS VISADA PELOS PURISTAS?
Pela razão simples de que é a língua mais globalizada. É sobretudo uma questão
política, que varia de região para região. Quem fala quíchua, no Peru, não está
preocupado com o inglês, mas com vocábulos que remetem à história do domínio
espanhol sobre os povos indígenas. A política está sempre por perto nessas
questões.
<http://geo.yahoo.com/serv?s=97490435/grpId=11188121/grpspId=2137111712/msgId=6818/stime=1189528155_,_._,___
2.1.4. Alfabeto passa a
ter 26 letras
Fonte:
www.comunique-se.com.br
Está para entrar em vigor a unificação da Língua Portuguesa que prevê, entre
outras coisas, um alfabeto de 26 letras.
"A frequência com que eles leem no voo é heroica!". Ao que tudo indica, a frase
inicial desse texto possui pelo menos quatro erros de ortografia no Brasil. Mas
até o final do ano, quando deve entrar em vigor o "Acordo Ortográfico da Língua
Portuguesa", ela estará corretíssima. Os países-irmãos Angola, Brasil, Cabo
Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste
terão, enfim, uma única forma de escrever. As mudanças só vão acontecer porque três dos oito membros da Comunidade de
Países de Língua Portuguesa (CPLP) ratificaram as regras gramaticais do
documento proposto em 1990. Brasil e Cabo Verde já haviam assinado o acordo e
esperavam a terceira adesão, que veio no final do ano passado, em novembro, por
São Tomé e Príncipe. Tão logo as regras sejam incorporadas ao idioma, inicia-se o período de
transição no qual ministérios da educação, associações e academias de letras,
editores e produtores de materiais didáticos recebam as novas regras
ortográficas e possam, gradativamente, reimprimir livros, dicionários, etc. O português é a terceira língua ocidental mais falada, após o inglês e o
espanhol. A ocorrência de ter duas ortografias atrapalha a divulgação do idioma
e a sua prática em eventos internacionais. Sua unificação, no entanto,
facilitará a definição de critérios para exames e certificados para
estrangeiros. Com as modificações propostas no acordo, calcula-se que 1,6% do vocabulário de
Portugal seja modificado.
No
Brasil, a mudança será bem menor: 0,45% das palavras terão a escrita alterada.
Mas apesar das mudanças ortográficas, serão conservadas as pronúncias típicas de
cada país.
O que muda.
As novas normas ortográficas farão com que os portugueses, por exemplo, deixem
de escrever "húmido" para escrever "úmido". Também desaparecem da língua
escrita, em Portugal, o "c" e o "p" nas palavras onde ele não é pronunciado,
como nas palavras "acção", "acto", "adopção", "baptismo", "óptimo" e "Egipto". Mas também os brasileiros terão que se acostumar com algumas mudanças que, a
priori, parecem estranhas. As paroxítonas terminadas em "o" duplo, por exemplo,
não terão mais acento circunflexo. Ao invés de "abençôo", "enjôo" ou "vôo", os
brasileiros terão que escrever "abençoo", "enjoo" e "voo".
Também não se usará mais o acento circunflexo nas terceiras pessoas do plural do
presente do indicativo ou do subjuntivo dos verbos "crer", "dar", "ler", "ver" e
seus decorrentes, ficando correta a grafia "creem", "deem", "leem" e "veem". O trema desaparece completamente. Estará correto escrever "linguiça",
"sequência", "frequência" e "quinquênio" ao invés de lingüiça, seqüência,
freqüência e qüinqüênio. O alfabeto deixa de ter 23 letras para ter 26, com a incorporação do "k", do "w"
e do "y" e o acento deixará de ser usado para diferenciar "pára" (verbo) de
"para" (preposição). Outras duas mudanças: criação de alguns casos de dupla grafia para fazer
diferenciação, como o uso do acento agudo na primeira pessoa do plural do
pretérito perfeito dos verbos da primeira conjugação, tais como "louvámos" em
oposição a "louvamos" e "amámos" em oposição a "amamos", além da eliminação do
acento agudo nos ditongos abertos "ei" e "oi" de palavras paroxítonas, como "assembléia",
"idéia", "heróica" e "jibóia".
Antônio Houaiss
A escrita padronizada para todos os usuários do português foi um estandarte de
Antônio Houaiss, um dos grandes homens de letras do Brasil contemporâneo,
falecido em março de 1999. O filólogo considerava importante que todos os países
lusófonos tivessem uma mesma ortografia. No seu livro "Sugestões para uma
política da língua", Antônio Houaiss defendia a essência de embasamentos comuns
na variedade do português falado no Brasil e em Portugal.
Fonte:
www.comunique-se.com.br
Posição da ABL
O presidente da Academia Brasileira de Letras (ABL), Marcos
Vinícius Vilaça,
pediu ao governo português que promova ações concretas, e com brevidade, no
sentido de ratificar definitivamente o Acordo Ortográfico da Comunidade dos
Países de Língua Portuguesa. Vilaça lamenta que os portugueses mantenham a atual
resistência depois de 16 anos de formatação do Acordo, em 1991. Segundo ele, a
recusa contribui para um possível isolamento de Portugal. Vilaça lembrou que o português de Moçambique já vem se aproximando
crescentemente do inglês, por força de interesses de ordem econômica. O
presidente da ABL ressaltou que os países de língua espanhola utilizam apenas um
dicionário, resultado do trabalho da Real Academia da Espanha e de outras 17
academias de países hispânicos. "Nada nos deve separar de Portugal. Acho mesmo
que o governo do Brasil deveria ser mais categórico nesse tema", sugeriu. Para ajudar na adaptação dos brasileiros, a ABL disponibiliza pela internet um
serviço de tira-dúvidas do português. As perguntas são respondidas pelo
professor Sérgio Pachá em até quatro dias ao usuário.
2.1.5. A língua das ortografias. Os pontos
negativos e os positivos do novo acordo entre países lusófonos
Aldo Bizzocchi
http://revistalingua.uol.com.br/textos.asp?codigo=11357
Ortografia é assunto que sempre causa frisson. Provavelmente
porque muitos veem na grafia das palavras um patrimônio nacional, comparável ao
hino e à bandeira. Mudanças constantes de moeda,
constituição, regime de governo, denominação do país, e também de ortografia,
produzem na população um sentimento de instabilidade e baixa autoestima. O
português já passou por várias reformas ortográficas (ver Língua 11), e mais uma
se anuncia em 2009. A reforma ocorrerá porque três países - Brasil, Cabo Verde e
São Tomé e Príncipe - ratificaram o acordo ortográfico firmado em 1990. O argumento em favor da unificação é o de que o português é a 3ª
língua europeia mais falada no mundo, depois do inglês e do espanhol, e a
existência de duas ortografias atrapalha sua difusão internacional. O filólogo
Antônio Houaiss afirmava que o português é a única do Ocidente com mais de 50
milhões de falantes a ter duas grafias oficiais. O argumento é falso. Difícil acreditar que o acadêmico, exímio
tradutor de Joyce, ignorasse que o inglês tem duas ortografias, a britânica e a
americana, e mesmo assim é a mais difundida. A difusão de um idioma depende do
prestígio e do poder político, econômico e cultural dos países que o falam, e
não da grafia. Senão, o chinês, com escrita complicadíssima, não estaria cada
vez mais conhecido no mundo.
Prós e contras
O novo sistema ortográfico tem pontos
positivos. Em Portugal desaparecem o c e o p mudos, como em "acção", "acto",
"adopção", "baptismo", "óptimo" e "Egipto" (mas mantém-se em "facto", por ser
pronunciado). Também os encontros vocálicos ee e oo de "vêem" e "enjôo" perderão
o circunflexo. Entretanto, há muitos pontos negativos. Como a supressão total do
trema. Sem ele, como diferenciar "eqüino" (cavalo) de "equino" (ouriço-do-mar)?
E como saber a pronúncia de palavras pouco usuais, como "qüididade"? É de se
imaginar a confusão quando os livros escolares disserem que os equinos são
invertebrados, e as crianças pensarem em pangarés desossados! A nova norma fará com que os portugueses escrevam "húmido" como "úmido".
Só que "húmido" ("úmido") é da mesma etimologia de "humor", o latim humus, com
h. Se em Portugal ainda havia coerência ortográfica na palavra, agora
desaparecerá. Melhor mesmo seria eliminar de vez o h mudo e pronto. Também se simplifica o uso do hífen, o que é bom. Só que, ao mesmo
tempo em que se elimina o hífen de "anti-semita" (antissemita), ele é
introduzido em "microondas" (micro-ondas). O mais absurdo da reforma é que deixará de ser usado o acento para
diferenciar "pára" (verbo) de "para" (preposição), bem como o de "pêlo"
(substantivo) e "pelo" (preposição + artigo). O título Uma pistola para Jeca, do
filme de Mazzaroppi, poderá ser interpretado como "uma pistola cabe (ou é
oferecida) a Jeca" (sentido real do título) ou "uma pistola detém Jeca". E quem
vai entender o trocadilho no título do livro Pelos pêlos, de Ana Cristina César?
O que faltou
O projeto não toca em incoerências ortográficas: o já mencionado h
mudo; s, ss, c, ç, sc, sç, x, xc e z com som de /ss/; s, z e x com som de /z/; x
e ch com som de /ch/; g e j com som de /j/; "estender" x "extensão", "destro" x
"dextrose", "texto" (do latim textus) x "misto" (do latim mixtus), "em cima" x
"embaixo", etc. Uma reforma simplificadora é necessária, mas a que está em curso é
um frankenstein linguístico, produto de negociações políticas entre os países. O
resultado, como na política, foi um projeto desfigurado, em que se eliminaram
coisas boas e se manteve muito do que havia de ruim. Em vez de uma reforma radical e definitiva, como fizeram outras
línguas, as doses homeopáticas no português obrigam a que a cada 50 anos seja
feita nova reforma. Por sinal, avanços já previstos na proposta de 1907 ainda
não foram postos em prática, como a solução das grafias duplas x/ch, g/j, etc. É
notável que línguas como italiano, galego e catalão já tenham encontrado
soluções para tais casos. O português poderia inspirar-se neles. O italiano e o
romeno, por sinal, são as línguas românicas com sistemas ortográficos mais
simples e coerentes. E a grafia do italiano não sofre alterações significativas
desde o século 16, o que não deixa de ser invejável.
O exemplo inglês
O inglês possui duas ortografias, mas
bem poderia ter uma só. Afinal, organise e organize, humour e humor, e assim por
diante, não representam pronúncias diferentes. Já "Antônio" e "Antônio", "facto"
e "fato" indicam diferenças fonológicas inconciliáveis, tanto que ambos são
mantidos na reforma. As diferenças entre o inglês britânico e americano afetam
ligeiramente a ortografia e o léxico: a diferença marcante está na pronúncia.
Mas o inglês possui uma só gramática. Em qualquer país de língua inglesa, a
sintaxe é uma só. Ao contrário, o português não tem só duas pronúncias e duas
ortografias; tem dois léxicos e duas gramáticas bem diferentes. Comparem "Sentei-me cá com ela e ficámos a conversar" (Portugal) com
"Me sentei aqui com ela e ficamos conversando" (Brasil). Isso sem falar nos
esquisitos "golo" (gol), "cancro" (câncer), "guarda-fatos" (guarda-roupa), e nos
humorísticos "bicha" (fila), "cacete" (filão de pão) e "bica" (bebedouro).
Unificar o quê? Aliás, até nomes geográficos são distintos aquém e além-mar: "Irão",
"Moscovo", "Bagdade", "Copenhaga", "Nuremberga", "Checoslováquia", "Jugoslávia".
Nada semelhante ocorre em inglês.
Custo da mudança
Com a oficialização da nova grafia,
inicia-se a transição na qual os ministérios da Educação deverão reciclar os
professores e realfabetizar os estudantes, e editoras vão reimprimir livros,
dicionários e outros materiais. Tudo a custo social e financeiro elevadíssimo. O argumento de que não será mais preciso reimprimir livros
brasileiros em Portugal e vice-versa, é outra inverdade: basta comparar a
tradução portuguesa e a brasileira de qualquer best-seller para ver que falamos
línguas diferentes, ainda que com uma só grafia. Embora a realização de uma reforma seja custosa, é preciso ter em
mente que qualquer reforma, mínima que seja, implica tais custos. Por isso,
deveríamos aproveitar a oportunidade para promover uma reforma radical e
definitiva na ortografia, eliminando as incoerências e instituindo um sistema
simples e prático - ainda mais que a maioria dos falantes do português no mundo
tem baixa ou nenhuma escolaridade, e a maior parte dos países lusófonos é pobre
e presta serviços educacionais fracos. Com a nova reforma, estima-se que 1,5% do vocabulário lusitano e de
0,5% do brasileiro sofrerão modificações gráficas. Apesar disso, serão
conservadas as pronúncias típicas de cada país. Ou seja, na prática, a
"unificação" pouco unifica.
Mudanças que saltam à vista
Trema -
Cai na maioria das palavras, como "tranqüilo",
mas permanecem termos derivados de outras, de língua estrangeira, que tenham o
sinal. Hífen - Cai em palavras que designam um ser ou objeto único, como anti-semita (que vira "antissemita"), mancha-chuva (vira "mandachuva") e pára-quedas("paraquedas").
Ditongos ei e oi
- Deixam de ser acentuados, como "idéia". Encontros vocálicos oo e ee
- Deixa de ser acentuado em terminações como "enjôo". Alfabeto -
Ganha três letras: k, y, w. Consoantes mudas
- Deixam de existir em Portugal e outros países, como "acção". Acento diferencial
- Desaparece, como em "pára" (verbo) e "para" (preposição). Dupla grafia
- Admitida em diferenças fonológicas
inconciliáveis, como "fato" e "facto", "cômodo" e "cómodo".
Aldo Bizzocchi é doutor em
Linguística pela USP e autor do livro
Léxico e Ideologia na Europa Ocidental (Annablume).
www.aldobizzocchi.com.br
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